quarta-feira, 31 de março de 2010

VALPAÇOS, CONCELHO DA FOICE


Diz-se por aí que Valpaços é o concelho da foice, mas o que a maior parte das pessoas não sabem é o porquê de chamarem o concelho "da foice". Na edição n.º 13 do Jornal Arauto da Casa do Povo de Vilarandelo saiu um texto da autoria do Sr. Eduardo Ferreira Costa, ilustre Vilarandelense
que vive em Valpaços. O Sr. Eduardo conta um episódio interessante sucedido no inicio do século XX em Valpaços que passo a transcrever:


"Era isto que eu ouvia vezes sem conta, principalmente, quando fui a tropa em 1967.



No comboio entravam mancebos de todos os lados e perguntavam-me:



- De onde és?...



- Sou de Valpaços.



- Ah!... És do CONCELHO DA FOICE...



A foice em questão é a foice roçadoura, de cabo comprido para roçar mato, silvas e infelizmente praticar alguns crimes, naquela época. Porque a dos ceifeiros era gadanho e ceifeiros havia muitos em todo concelho.



Eu tinha 14 anos quando um senhor de Vilarandelo, com os seus 90 anos me contou a revolta popular e o assalto, do qual ele mesmo participou, às finanças de Valpaços. Por motivos de lançamento e subida de impostos daquela época, mais concretamente em 1935.



Houve uns cabecilhas que mobilizaram a população do concelho, no dia aprazado, estavam organizadas duas concentrações, uma em Carrazedo e outra em Vilarandelo para rumar a Valpaços. Porem, alguns bufos traíram a população e avisaram o chefe das finanças da revolta do povo. Desta forma, oportunamente, o chefe das finanças alertou e mobilizou as tropas de cavalaria do Porto para que no dia marcado estivessem à espera dos revoltosos.

A concentração que estava preparada em Carrazedo para rumar a Valpaços, viu passar por lá a cavalaria e desmobilizou, abortando as suas intenções, no entanto, não avisaram a outra concentração que estava preparada em Vilarandelo, uns dizem que foi por falta de tempo, outros dizem que foi medo de represálias e como não havia telemóveis, a mensagem não passou.


Os da zona de Vilarandelo, ninguém faltou à hora marcada. Bairistas, Malteses e perigosos, armados com armas de fogo, sacholas, forquilha e foices, uns calçados outros descalços, parriqueiro abaixo a toque de caixa, que ritmava a marcha. O homem do cornetim que ensaiou previamente o toque para avançar ou recuar, de acordo com as condições. Alguns populares menos crentes iam pelos campos a corta-mato, (mirones) para ver o resultado daquela aventura.

Eis em Valpaços, determinados invadiram as finanças, queimando e destruindo muita papelada, quando se aperceberam, estavam cercados pela cavalaria. foi cada um por si, uns foram presos, outros pisados pelas patas dos cavalos e outros fugiram em debandada pelos campos, atirando com as armas do crime aos poços. Depois de recolhidas essas armas, as que estavam em maior número eram as foices. Daí Valpaços ter ficado conhecido pelo Concelho da foice.

Dos revoltosos, os que ficaram presos foram logo condenados a sustentar cavaleiros e cavalos temporariamente até os ânimos acalmarem. Quando foram julgados, o Juiz apercebeu-se que a revolta teve origem na base de três famílias, a dos Tétés, dos Turíbios e dos Taraitas, daí o rótulo da revolta dos três "TTT".

Eu vi e li jornais nacionais que noticiaram o acontecimento naquela altura.

Desafiava os nossos governantes a assumirem a história do Concelho, para o bem e para o mal. Temos tantas rotundas tão pobres e tão despidas, porque não um monumento alusivo ao concelho da foice? Até poderá servir de símbolo para outros fins. Faço um apelo aos meus conterrâneos de Vilarandelo, como andam a fazer o jardim público no Largo do Toural, porque não um monumento a comemorar esta revolta popular? Isto não acontece todos os dias, nem todos os anos, nem todos os séculos, mesmo que naquela altura tivesse sido uma derrota. Hoje faz parte da história e ela, é feita de conquistas e derrotas. Pensem nisso, digníssima Junta de Vilarandelo."



EDUARDO FERREIRA COSTA

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